terça-feira, 14 de setembro de 2010

 QUEM PODE
OS LIVRAR DA
AMEAÇA X?


 Por Raul Longo
 
Se prevalecer o bom senso e a previdência que tem sido marcante nas administrações e gerências da sucessora de Lula da Silva, o parecer do eminente cientista Paulo César Simões Lopes, Biólogo PH. D. contratado pela Caruso Jr. para o primeiro estudo de impacto ambiental de implantação e operação do Estaleiro Naval BN5, será suficiente nos parágrafos em que anota:

“- O empreendimento está deslocado do contexto sócio-econômico e cultural do local, que combina beleza cênica, valor biológico e alto potencial turístico da área”;

“- O empreendimento fará sentir seus efeitos nocivos numa grande área de influência, estando localizado numa zona extremamente crítica para efeitos de conservação, a magnitude dos impactos são, em boa parte, permanentes e irreversíveis não existindo assim, alternativas de instalação do empreendimento no local ou mitigação destes impactos”;

“- Sugere-se, fortemente, a relocação do empreendimento para outra área, onde já existam complexos portuários fora de baías ou enseadas, de maneira que os efeitos nocivos não sejam potencializados como ocorre nas áreas internas.”

Não inventei nada. Estou com a cópia aqui na mão e posso provar que os negritos e sublinhagens são do próprio cientista. Como também os do último parágrafo no qual arremata:

“Em vista disto, o presente parecer sugere aos responsáveis que não aceitem o risco do passivo ambiental, considerando assim a proposta da obra na área referente ao Estaleiro BN5 como ambientalmente inviável.”

Pois apesar de tão categóricas e recalcadas, estas recomendações foram simplesmente ignoradas tal como Fernando Henrique Cardoso ignorou as recomendações da então Secretaria de Minas e Energia do Estado do Rio Grande do Sul sobre a eminência de um apagão que ao país custou o prejuízo de R$ 45,2 bilhões de reais.

Naquela vez, do Rio Grande do Sul ao Paraná Dilma Rousseff livrou toda a região da ameaça do corte energético, mas agora a determinação do homem mais rico do país em sacrificar o único polo turístico internacional litorâneo entre a Terra do Fogo e o Rio de Janeiro, arregimenta aloprados que chegam até a declarar absurdos como ausência de atividade pesqueira na baía norte da Ilha de Santa Catarina.

Qualquer dono de restaurante da região sabe ser a fonte de cerca de 70% do pescado e frutos do mar comercializados no mercado local. Estas e outras tentativas de desqualificação das constatações do cientista Simões Lopes, ratificadas pelo parecer dos técnicos do ICMBio, órgão do Ministério do Meio Ambiente responsável pela manutenção e pesquisa das três reservas ambientais na área da Baía Norte da Ilha de Sta. Catarina; são ainda mais ridicularizadas por um grupo de professores e pesquisadores encabeçado por Leopoldo Cavaleri Gerhardinger, doutorando em oceanografia pela UNICAMP com especialização na Europa.

Estes cientistas demonstraram que o relatório substituto das recomendações de Simões Lopes: “não apresenta condições consideradas mínimas para a adequada mensuração, dimensionamento e avaliação dos impactos do empreendimento sobre as populações de peixes marinhos”, além ser falho na “avaliação dos impactos da obra e no funcionamento do empreendimento”.

Mais que isso, os cientistas acusam a Caruso Jr., empresa de consultoria contratada pela OSX, por apresentar “resultados e conclusões negligentes e visíveis inconsistências com a literatura e normatização científica (inclusive com os próprios resultados e dados empíricos levantados) bem como argumentações tendenciosas”.

Por fim condenam a Caruso Jr. e a OSX concluindo que o relatório que apresentaram: “é INCONSISTENTE [maiúsculas no original] no diagnóstico e análise de impacto ambiental do estaleiro” e “INACEITÁVEL e PREOCUPANTE [maiúsculas no original] a baixa qualidade técnica de tal estudo diante da grande responsabilidade a que se dispõem”, declarando-se “temerosos de que (tal conduta) se torne padrão nos processos de licenciamento ambiental na área marinha brasileira”.

Pergunto-me com que cara ficam os aloprados que tão acirrada e apressadamente saíram espalhando aos quatro ventos que a Ameaça X seria a redenção econômica de Santa Catarina?

Eu mesmo respondo: tão impassível quanto a de José Castelo Deschamps, prefeito de Biguaçu pelo PP, ao anunciar 500 mil assinaturas em abaixo assinado favorável a instalação do megaestaleiro no município de pouco mais de 55 mil habitantes e ainda com a mesma infraestrutura dos anos 70, quando ali se vivia exclusivamente da pesca, pecuária e agricultura.

A partir de meados dos anos 80, acelerada industrialização engordou alguns cofres com o aumento da arrecadação no município, exatamente com que hoje se busca justificar o interesse no empreendimento; mas igual impassibilidade dos antecessores de Deschamps manteve inexistente a infraestrutura do município e ineficiente o atendimento dos serviços públicos a uma população que se duplicou em duas décadas.

A arrecadação sem dúvida crescerá em algum cofre e também a população com a inevitável importação de mão de obra experiente de áreas onde operários do setor sejam excedentes. Somando-se aos vindouros e previsíveis autônomos prestadores de serviços correlatos ao empreendimento, somarão aí por volta de cinco mil almas num primeiro momento, até que mais tarde comecem a chegar os filhos, parentes e dependentes, para contribuir com futuro crescimento vegetativo.

Novos tempos, novos costumes e intercâmbio cultural com emigrantes de zonas portuárias onde a arrecadação tampouco é suficiente para atender a demanda do conglomerado populacional a se estender por favelas. Mas até aí, quando eventuais problemas advierem, é só encostar a culpa no Judas da vez.

Se o tradicional “letinho” eleger Ângela Amim novamente, certamente não será de quem a mídia monopolizada pelo grupo RBS se recordará como integrante da força tarefa dos candidatos ao governo de Santa Catarina que se reuniram no gabinete do Ministério do Meio Ambiente para desqualificar o parecer dos técnicos do ICMBio. Pelo menos nunca foram às licitações de linhas e terminais em sua administração municipal a que responsabilizaram pelos protestos contra as mais abusivas tarifas de transporte coletivo do Brasil. E, sim, ao “vandalismo” e “má educação” dos estudantes.

Tampouco será de Raimundo Colombo que lembrarão, se o eleito for o candidato do grupo de Luís Henrique da Silveira, Leonel Pavan e Dário Berger. Da mesma forma que à Operação Moeda Verde computaram excessos da PF a incomodar o fluxo das verbas publicitárias de empreendimentos em reservas ambientais, costeiras, áreas públicas, de preservação permanente, ou de e da Marinha.

Já Ideli Salvati, se eleita, por alguma razão assoprada pelas últimas décadas de convivência com a mídia de todo o país, tem tudo para ser o alvo assim que começar a malhação pelo aumento do custo da alimentação diária, pela necessária importação do ingrediente básico da dieta regional: pescados e frutos do mar que, hoje, estão aí a um lance de rede ou anzol, ou algumas poucas remadas.

Se, como é de se esperar de uma governante do Partido dos Trabalhadores, a Presidente Dilma Roussef impedir a extinção dos meios de subsistência e de trabalho de pescadores, maricultores, nos setores de gastronomia, comércio e turismo da região; ambas serão acusadas por inviabilizar 4 mil empregos mesmo sabendo-se que, se tantas, não ultrapassarão 500 vagas para uma população inexperiente numa atividade especializada que aqui nunca existiu.

No entanto haverá quatro anos de governo pela frente e muita água a passar por sob a ponte Hercílio Luz que, admirando seu perfil à distância, em momentos de poesia chamo de Tênue Ponte da Luz. Mas ponte sobre águas pútridas, por mais iluminada que seja, não faz poesia alguma e se a Ameaça X deixar de ser ameaça, efetivando-se os estragos previstos pelos peritos, sem dúvida também se efetivará a praga dos que queriam acabar com a raça do PT por 30 anos.

Não o conseguiram no Brasil de Lula e Dilma, mas certamente o conseguirão no estado para cujo governo cheguei a pensar em votar no candidato do PSOL que se posicionou contrário a Ameaça X, diferentemente dos demais que em suas peças e programas de campanha eleitoral sequer se referem ao empreendimento que tão acirradamente defenderam contra o bom senso dos técnicos e cientistas. Mas qual a chance do PSOL ser eleito?

Entre os três possíveis futuros governadores de Santa Catarina, dois são inegavelmente interessados na efetivação do estrago e indubitavelmente não medirão esforços para influir em todos os níveis de Poder, pela Câmara, pelo Senado, pela Mídia e por onde mais encontrem caminho para tal aumento de arrecadação a qualquer custo, por mais que custe à população que, em troca, de seus governos sempre recebeu tão pouco.

Para esses, depois é só tirar o corpinho de cena e jogar à culpa pra Presidente, como erro de responsabilidade federal que não são tontos de assumir em suas mensagens eleitorais.

Já Ideli Salvati, apesar de me ter deixado com o voto na mão, como a tantos eleitores e colegas militantes que ainda se dizem decididos em anular, creio já ter melhor avaliado suas próprias anteriores posições a respeito do assunto.

Não tenho dúvidas de que a essas alturas Ideli já terá reconhecido que, se eleita, a Ameaça X não é apenas à possibilidade de sua reeleição em 2014, mas sim à nossa raça inteira por todo o futuro de Santa Catarina.

Por essas e outras cheguei a uma conclusão. Meu voto é da Ideli* porque só ela poderá nos livrar dessa praga de megaestaleiro em Biguaçu, o local mais errado a ser escolhido segundo o Doutor Paulo César Simões Lopes.

*A opção político-eleitoral é do autor, não refletindo a posição do Movimento em Defesa das Baías de Florianópolis.

Um comentário:

Flora Neves disse...

Muito bom o texto Raul. Parabéns!
Que cada um haja em prol de um bem comum, que são as nossas Baías, e que em seu trabalho, sua casa, no seu prédio, na sua escola, divulgue o que está acontecendo de verdade (e que a grande mídia não está mostrando e sim omitindo e até mentindo a respeito do assunto, porque é paga para não falar). Cabe a nós cidadãos dessa Ilha lutarmos para defender nossos postos de trabalho com a maricultura, turismo do ano inteiro e nossa qualidade de vida. Não é para ver uma praia cheia de óleo e morar ao lado de um estaleiro que gaúchos, paulistas, paranaenses vêm todos os anos morar em Santa Catarina.
Temos que, nós sociedade civil organizada, discutir em conjunto com o poder público o tipo de desenvolvimento a médio e longo prazo que queremos para Florianópolis. DO contrário, perderemos nossas mais belas praias para megaempreendimentos e viveremos do que? De postos de serviços na área industrial e tecnológica? É ISSO QUE QUEREMOS?
Responda você pra si mesmo e depois reflita sobre o que está fazendo para participar e se manifestar a respeito!