terça-feira, 2 de novembro de 2010

ALERTA: Visite Florianópolis antes que se acabe (EM PORTUGUÊS)


Visite Florianópolis antes que se acabe



Por Celso Martins*

ESTALEIRO OSX

Quem está acostumado a passar o verão em Florianópolis, no Estado de Santa Catarina (Brasil), deve aproveitar a que pode ser a penúltima ou última temporada. Para o ano de 2011 está prevista a construção de um mega-estaleiro na orla da Baía Norte de Florianópolis, em frente às praias de Canasvieiras e Jurerê, no vizinho município da Biguaçu. O momento do maior impacto, o da construção de um canal com mais de 13 quilômetros, vai demorar cerca de 210 dias, ameaçando as praias mais movimentadas com a erosão e seu desaparecimento.

Além disso, o Estaleiro OSX poderá dar um rumo inesperado à dinâmica econômica regional, promovendo o adensamento populacional sem a infraestrutura adequada, inviabilizando a maricultura e a continuidade da pesca, sobretudo a do camarão, e desestruturando as diferentes comunidades instaladas na orla das baías de Florianópolis. Além disso, existe o risco do desaparecimento de praias ou trechos de praias na Daniela e Jurerê, e a poluição por combustíveis e produtos tóxicos em eventuais acidentes, com a conseqüente desvalorização de todos os imóveis.

O tamanho do negócio

Não é um galpão para construir barquinhos. Trata-se de uma iniciativa da OSX, “empresa do Grupo EBX, fundado e presidido por Eike Batista há quase 30 anos, desenvolve e administra negócios nos setores de mineração, energia, logística, petróleo e gás, fontes renováveis, entretenimento e também no setor imobiliário”, segundo o site da EBX.

Foi anunciado um investimento de R$ 2.080.000.000,00 (dois bilhões e oitenta milhões de reais) para a construção do estaleiro, segundo o EIA, mas esse valor tem variado para mais e para menos. A previsão orçamentária de 2011, para a Prefeitura de Florianópolis é de R$ 1,3 bilhão.

No estaleiro vão ser construídos “navios plataforma tipo FPSO, plataformas semi-submersíveis, plataformas tipo TLWP, sondas moduladas, conveses, navios sonda (drillship) e jaquetas de plataformas fixas. O estaleiro também se dedicará a conversão de cascos de navios em FPSO”, conforme o site da OSX. Os alvos são as reservas de petróleo do pré-sal e os equipamentos para sua exploração.

Tudo isso será feito em uma área com 155,33 hectares (1.553.300 m²) na localidade de Tijuquinhas, município de Biguaçu-SC, região metropolitana de Florianópolis.

A empresa acena com 4.000 empregos diretos, o que justificaria o atropelo da legislação ambiental e a degradação da Baía Norte de Florianópolis.

O empreendimento se situará entre a Área de Proteção Ambiental (APA) de Anhatomirim, a reserva Biológica Marinha do Arvoredo e  Estação Ecológica de Carijós, dentro da Área de Normatização de Pesca e Turismo.

O canal entre o local do estaleiro e o alto mar será fruto da dragagem de 8.750.000 m³ de sedimentos (areia, argila), embora os estudos iniciais indicassem a necessidade de retirada de 16.247.992,9 m³.

A profundidade do canal será de 9 metros, mesmo estando previstas embarcações com calado maior.

A largura do fundo do canal será de 167 metros, mais os taludes laterais com 36 metros cada (ângulo de 45º), acrescidos de uma faixa de segurança de 50 metros nos dois lados, o que dá um total de 339 metros. O espaço ganhará isolamento por bóias.
Extensão do canal: entre 13,2 e 14,5 quilômetros (as duas informações estão em lugares diferentes do EIA-RIMA do empreendimento).

O licenciamento

Apesar do empreendimento prever um canal em plena Baía Norte de Florianópolis, o processo de licenciamento ficou com a Fatma, que realizou três aparatosas audiências públicas em Governador Celso Ramos, Biguaçu e Florianópolis.

Por se encontrar na área de influência das três unidades federais de conservação, o licenciamento precisou da anuência do órgão responsável, o Instituto Chico Mendes para a Biodiversidade (ICMBio). Após estudos, o órgão negou a anuência, postura reafirmada posteriormente.

Começa então um dos episódios mais tristes de nossa história recente, quando a população assistiu estarrecida a capitulação de nossas lideranças políticas e econômicas, na véspera de importante pleito eleitoral. Reunidos todos os candidatos, a eles se juntaram próceres do comando estadual, indo todos a Brasília pedir que a negativa do ICMBio local fosse revertida, abrindo caminho para a concessão da licença. O resultado dessa pressão foi a criação de um grupo trabalho fazer nova análise do processo.

O desmonte do EIA-RIMA

O EIA-RIMA do empreendimento começou a ser desmontado no início da madrugada de 23 de julho último, nos 10 minutos finais da audiência pública realizada pela Fatma e a OSX em Jurerê Internacional, pelo Promotor de Justiça Rui Arno Richter: o Ministério Público catarinense não tem nada contra o Estaleiro OSX, mas vai agir em caso de irregularidade e não aceitará a degradação ambiental.

Na ocasião, o promotor do meio ambiente da Capital assinalou que o empreendimento, ao contrário do que conclui o EIA-RIMA, terá sim profundos reflexos na Baía Norte de Florianópolis, que também não detalha as conseqüências da dragagem do canal e o conseqüente aumento da turbidez e de matérias em suspensão nas águas marinhas. Considerou que as alternativas de localização em São Francisco do Sul, Itajaí e Imbituba, foram “rapidamente descartadas” com argumentos “extremamente insatisfatórios”. Problemas como o rápido adensamento populacional de Biguaçu e região, sem a necessária infra-estrutura, não foram considerados no Estudo. Por fim, entre outras observações, cobrou dos órgãos públicos a definição de limites do uso da Baía Norte antes da concessão da licença. Disse temer que o Estaleiro OSX possa ser a porta de entrada para “outras atividades impactantes”, social e ambientalmente.

Em seguida vieram os cientistas. Um parecer do professor Paulo Simões, contratado pela empresa Carujo Jr. para elaborar estudo a ser incluído no EIA-RIMA, foi descartado. Motivo: o cientista considerou o empreendimento “ambientalmente inviável” nas águas das baías de Florianópolis.

Por esse tempo surgiu a Nota técnica: Impactos potenciais do Estaleiro sobre a pesca artesanal, trabalho elaborado pelo oceanógrafo Rodrigo Pereira Medeiros e a bióloga Carina Catiana Foppa. Apesar de o EIA-RIMA não oferecer “condições para uma análise consistente” dos impactos na atividade pesqueira artesanal, os poucos dados contidos no documento, são suficientes para assegurar que o empreendimento pode inviabilizar a “continuidade da atividade” na região.

O “Parecer independente” elaborado por um grupo de cientistas brasileiros encabeçado pelo oceanógrafo Leopoldo Cavaleri Gerhardinge, representou outro golpe na credibilidade do EIA-RIMA: o diagnóstico da ictiofauna marinha (peixes, camarões etc) e dos impactos representados por espécies invasoras, apresentado no Estudo “não apresenta condições consideradas mínimas para a adequada mensuração, dimensionamento e avaliação dos impactos do empreendimento sobre as populações de peixes marinhos”. É falho também na “avaliação dos impactos da obra e no funcionamento do empreendimento”.

Mais recentemente foi realizado um seminário interuniversitário no campus da UFSC, em Florianópolis, onde diferentes cientistas reafirmaram as ameaças sociais e ambientais do Estaleiro OSX, entre eles o oceanógrafo Marcus Poletti, da Univali, o economista Hoyedo Lins, e a arquiteta Margarete Pimenta, ambos da UFSC, entre outros. Todas estas manifestações da comunidade científica foram encaminhadas ao Ministério Público (estadual e federal), Fatma e ICMBio.

A resistência

A resistência ao estaleiro foi encabeçada pelos moradores do Pontal de Jurerê (Daniela) e de Jurerê Internacional, com as adesões de entidades como a Associação de Bairro de Sambaqui (ABS) e o respaldo da União Florianopolitana das Entidades Comunitárias (Ufeco), ambientalistas, maricultores e pescadores de São Miguel (Biguaçu) e Governador Celso Ramos.

A motivação inicial foi a ameaça de erosão e desaparecimento das praias da Daniela e Jurerê, entre outras, associada ao temor da poluição. O risco de transformação do atual modelo sócio-econômico de Florianópolis onde desponta o turismo estimulando os setores de serviços, comércio e construção civil, associado ao setor de tecnologia de ponta (informática, robótica), também contribuiu para a mobilização.

Foram realizadas manifestações pelos pescadores de São Miguel (Biguaçu) e moradores de Sambaqui, condenando o empreendimento. Em Jurerê Internacional houve ato público liderado pela Associação de Moradores e Proprietários local (AJIN), após assembléia onde apenas uma pessoa votou a favor do estaleiro. Esta última atividade teve o mérito de reunir sob uma mesma bandeira os desprezados pescadores da Baía Norte de Florianópolis com os moradores de uma das experiências mais bem acabadas da opção sócio-econômica da cidade – o bairro de Jurerê Internacional. Resistência reunida sob a denominação de Movimento em Defesa das Baías de Florianópolis, cujo blog divulga o andamento das ações.


A capitulação

O anúncio da implantação do Estaleiro OSX funcionou como um “canto da sereia” para as camadas menos favorecidas da população, aliado à completa capitulação de nossas elites dirigentes – Associação Comercial e Industrial de Florianópolis (ACIF), Sindicato da Indústria da Construção Civil da Grande Florianópolis (Sinduscon) e Federação das Indústrias do estado de Santa Catarina (Fiesc), importantes empresários e, principalmente, quase a totalidade da liderança política.

A rigor, somente a executiva do PT de Florianópolis se posicionou em nota contra o empreendimento, iniciativa que foi repudiada pela cúpula petista. Dos candidatos ao Governo do Estado, apenas o professor Valmir Martins (PSOL) se mostrou claramente contrário ao estaleiro no local proposto. A senadora Ideli Salvati (PT) chegou a pedir em público a cabeça do dirigente do ICMBio local. E vivemos momentos de grande apreensão, quando o ministro da Pesca Altemir Gregolim, declarou que os danos do empreendimento não seriam grandes no setor: a maricultura poderia ser realocada e a pesca na Baía Norte não era “significativa”.

Desse modo, políticos de todos os espectros disseram sim à iniciativa. Na Assembléia Legislativa o deputado estadual do PMDB Edson Andrino (que não conseguiu se reeleger), articulou uma “frente parlamentar” que levou os interessados no OSX à Brasília fazer pressões junto ao Ministério do Meio Ambiente e ICMBio. A comitiva teve a presença do dirigente máximo do órgão ambiental estadual (Fatma), Murilo Flores, onde o licenciamento (ainda não concedido) está sendo avaliado.


SAIBA MAIS






*Celso Martins é Jornalista desde 1976 (Registro Profissional SC-00789-JP) e Historiador (FAED-Udesc, 2003-2007), residente em Florianópolis-SC (Brasil), titular do blog Sambaqui na Rede e colaborador do Portal Desacato e da revista Pobres&Nojentas.

Fonte: Portal Desacato

Navio Plataforma Tipo FPSO.

Plataforma Semi-Submersivel. A da foto é a P-52.
Plataforma do Tipo TWLP.
Navio-Sonda do tipo "Drillship".
Jaqueta de Plataforma produzida pelo Estaleiro Mauá - RJ. No fundo, a Ponte Rio-Niterói.
Canal de Navegação que precisará ser dragado, pois a Baía Norte é muito rasa.
Maquete do Projeto do Mega-Estaleiro OSX.



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